quarta-feira, fevereiro 22, 2006

O Falso Mudo, o poeta que sangra em palavras.

Me perguntaram porque calei a poesia.
Se havia enjoado de sambinha, de Vinícius, de Betânia e de todas aquelas vozes das quais sempre fui arauto. Se havia me cansado daquelas palavras que entoava com tanta fé e tanta intimidade que era como se advogasse pelos poetas perante Deus.
Me perguntaram, enfim, se eu havia perdido a fé na paixão.
Estão incomodados comigo, como fazem as pessoas diante de alguém que abandona tudo aquilo que lhe é peculiar e íntimo. Como uma criança indiferente a um doce ou um velho que admira suas saudades com contemplação silenciosa e inerte.
Eu digo.
É que quando escuto um samba bonito, quando vinícius fala baixinho que "o amor é um espinho que não se vê em cada flor"; quando ele fala sobre saudade, quando ouço a profundidade de um bolero na voz de Bethânia; quando leio Neruda, Drummond, Quintana, quando mergulho em palavras com esses velhos investigadores da profundeza da paixão carnal, tudo aflora e tudo dói.
É que enquanto cantava e repetia aquelas profecias de amor e paixão, o que eu queria, acima de tudo, era entender o que se continha naquelas palavras.
Eu vivi a paixão, eu vivi o amor e a minha miséria, agora, foi ter perdido tudo isso.
E hoje, tenho medo de cantar e chorar.
Se tentar escrever, é capaz que o coração se rasgue e minha alma derrame em preto e branco.
Aí então os amigos me dariam tapinhas nas costas com aqueles inúteis olhares de piedade; os impacientes virariam as costas com desprezo e os críticos me chamariam de meloso e repetitivo. E dessa forma, aquelas palavras que retratariam a minha própria essência desnuda estariam assim, expostas ao mundo, ridicularizadas.
E ninguém, por fim, teria curado a ferida que haveria aberto.
Por isso calo as palavras e contemplo a passagem do tempo para que a dor se vá.
Por isso tenho sido o inverso de mim.

5 comentários:

Anônimo disse...

"Acabei com tudo
Escapei com vida
Tive as roupas e os sonhos
Rasgados na minha saída
Mas saí ferido
Sufocando meu gemido
Fui o alvo perfeito
Muitas vezes no peito atingido
Animal arisco
Domesticado esquece o risco
Me deixei enganar
E até me levar por você
Eu sei
Quanta tristeza eu tive
Mas mesmo assim se vive
Morrendo aos poucos por amor
Eu sei
O coração perdoa
Mas não esquece à toa
E eu não me esqueci
Eu andei demais
Não olhei pra trás
Era solto em meus passos
Bicho livre, sem rumo, sem laços
Me senti sozinho
Tropeçando em meu caminho
À procura de abrigo
Uma ajuda, um lugar, um amigo
Animal ferido
Por instinto decidido
Os meus rastros desfiz
Tentativa infeliz de esquecer
Eu sei
Que flores existiram
Mas que não resistiram
A vendavais constantes
Eu sei
Que as cicatrizes falam
Mas as palavras calam
O que eu não me esqueci
Não vou mudar
Esse caso não tem solução
Sou fera ferida
No corpo, na alma e no coração"
Não resisti a comentar com esta música, Uri. Bjo.

Anônimo disse...

Não tenha medo de cantar ou chorar... Torço para que descubra, aí mesmo, no seu próprio inverso, novas maneiras de canto, lágrimas, escrita e amor...

Anônimo disse...

É,o tempo realmente é o melhor remédio...
Sei bem como são esses tapinhas nas costas,rs...
Bom,se vc estiver feliz sendo o seu inverso,eu fico feliz por vc.Se vc ficar feliz com o contrátrio,eu fico feliz por vc...A vida passa mt rápido,e só o q importa é ser feliz,seja do jeito q for!!!
Bom carnaval!!!

Anônimo disse...

Amigo meu poeta, desembuche e me conte logo tudo. Acho que tudo ainda foi contado pela metade. Seu sorriso anda triste. Abração. Damásio

Anônimo disse...

nada como o tempo, amigo...
"é capaz que o coração se rasgue e minha alma derrame em preto e branco. " cara...a minha alma tb é preta e branca!
hahhahaha....
abracos!