Quando pequeno, lembro de sonhar com areia.
Era uma grande bola de areia - sim, nos sonhos de crianças elas são possíveis -, e ela rolava aumentando de tamanho e, à medida que aumentava, ela se tornava mais leve e, à medida que ficava leve, a superfície pela qual rolava se tornava mais rugosa e o seu rolar na superfície irregular era algo incômodo e insuportável, eu sentia isso.
Quando a bola de areia parecia atingir seu ápice de tamanho e a superfície já não tinha como ser mais irregular, ela se equilibrava sobre a ponta de uma agulha e essa imagem simbolizava o extremo de uma angústia sufocante.
Mas a bola se tornava pequena de novo, pequena como a ponta da agulha em que se equilibrava e sua densidade era tanta que seu peso era muitas vezes maior, mas a superfície se tornava lisa e o seu deslocamento era, então, suave, lento e tranquilo.
Eu devia ter três ou quatro anos, pelas minhas contas de adulto.
Não havia medos nem a escravidão da lógica, só a angústia ilustrada por minha própria imaginação.
Meus sonhos eram uma aliança intuitiva entre o que sentia e as coisas que via no mundo sem saber ao certo o que eram, como areia, peso ou agulha.
Hoje sinto meus sonhos contaminados pela lógica, enquadrados.
Mas na noite passada, eu vi areia em um sonho qualquer e, no próprio sonho, lembrei daquele sonho de criança. Nesse meta-sonho, eu vi que um dia fui capaz de elaborar algo despido de todos os conceitos que me foram socialmente servidos até hoje, eu era pura imaginação.
Percebendo isso, quis construir um sonho novo, então pulei no ar e saí voando.