quinta-feira, janeiro 15, 2004

Quando virão aqueles dias?

Meu pensamento é cíclico, viciado.
A grande tortura da minha adolescência é o que hoje ainda me incomoda: Deus.
Nunca fui capaz de assimilar completamente os dogmas de religião. Não me interessava religião, não me interessavam rituais, não me interessavam quaisquer adornos daquela palavra tão estranha, tão misteriosa, tão carregada de sentido: DEUS.
Afinal, o que é Deus?
Será esta força que nos põe em contato uns com os outros? esta indiscutível troca de energias que acontece na convivência humana?
Desconfio que Deus seja isso: amor etéreo. Se assim for, o que fizemos em sociedade senão condicionar o amor, relativizar a fraternidade e a igualdade? enfim, será que estamos matando Deus?




Informo a todos que estou impossibilitado de acessar o blog. Obrigado aos meus leitores, agradeço a atenção e as visitas e informo que meu e-mail é uridutra@yahoo.com, caso queiram entrar em contato.
Descubram Deus.

sexta-feira, janeiro 09, 2004

Terra seca, sementes velhas.

Toda noite tinha um sonho, o mesmo sonho.
Batia léguas até desandar num emaranhado de pano, linha e pau. Uma rede estranha trançada com linhão e fita vermelha, agarrado em taliscas de um limoeiro seco. Um pau espinhento, como que agourando qualquer coisa em volta.
Era só ele ali, só ele se prendia à rede, aos espinhos, ao pau e à terra.
Só restara ele, é verdade. Dos sabidos e dos bestas, das meninas e dos machos, dos fortes e dos fracos, dos doze filhos de seu Sebastião e dona Flora, dos que morreram matado e nascido, dos sete que restaram, somente ele. Prá cuidar das terras, plantar maniva e caiar a casa. Prá pegar, na cidade, a "aposentação" dos velhos, carrear os bodes prá feira, cuidar da farinha e fumar na porta da casa, vendo o sol se ir numa tarde amena, depois de ter castigado a terra dura e acochado as raízes das plantas.
Sabia que o sonho sempe começava com ele saindo em busca do Jequitinhonha, légua e meia da casinha velha, com vara, anzol e balde. O céu então ficava cinza da cor dos lajedos e no nem-tarde-nem-noite de chuva, sua visão se turvava, era então que o vulto aparecia de longe e, se tornava o único ponto visível, o único rumo lógico. Eram os panos balançando no vento de chuva, era a teia de pano-de-saco-de-farinha embandeirando a galhada seca no pleno sertão sedento.
Era ele preso ali, era ele compreendendo que sua vida ia embora, seus braços e pernas atrelados ao mal-agouro daquela planta morta e má. Sentia que eram suas as raízes encravadas na terra e que era ele próprio quem estava cheio de espinhos e o mesmo ele quem mau-olhava e prendia qualquer esperança de ser linha, e trançar qualquer destino, de ser pano e revoar com a ventania.